sexta-feira, 20 de maio de 2011

E O PARTICÍPIO CONTINUA...

Há uma questão no que diz respeito ao particípio que não posso deixar de lembrar: algumas formas equivocadas de determinados verbos. Quanto ao uso da língua falada, existe um processo – bastante antigo – de redução de certas estruturas. O falante, a fim de economizar tempo e esforço, muitas vezes, altera a forma do verbo, diminuindo seu tamanho, literalmente.
Atualmente, tem havido uma tendência a se reduzir a forma regular do particípio de alguns verbos, construindo-se uma estrutura com o verbo auxiliar ter ou haver acompanhado de uma nova forma de particípio. Digo uma “nova forma” pelo fato de não existir o particípio irregular do verbo, e o falante tomar, grosso modo, a 1ª pessoa do singular como empréstimo nessa construção. Tenho ouvido muitas pessoas dizerem “Eu tinha trago o documento...” ou “Eu tinha chego na hora marcada.”. O uso está se ampliando bastante, a ponto de eu já ter observado um processo de generalização desse fenômeno, como, por exemplo, em “Eu tinha falo isso para todo mundo...”.
É preciso esclarecer que os verbos trazer e chegar têm somente uma forma de particípio: o regular. Nesses casos, independentemente do auxiliar, só existem trazido e chegado. Ao empregá-los, teremos frases como estas, por exemplo: “Eu tinha trazido o documento para reconhecer firma.”; “O documento foi trazido até o juiz para reconhecimento de sua autenticidade.”; “Eu tinha chegado na hora certa, mas a reunião acabou atrasando.”; “Era chegada a hora dos cumprimentos aos noivos.”
A forma verbal trago não tem nada a ver com o particípio. Ela constitui a 1ª pessoa do singular (eu) do verbo trazer ou do tragar, no presente do indicativo. Sendo assim, seu uso só fica adequado em contextos como estes: “Eu trago sempre meus óculos comigo.” ou “Quando, sem querer, trago a fumaça de um cigarro, fico com uma tosse horrível.”.
O mesmo acontece com chego. Seu emprego também está previsto apenas no tempo presente. Assim sendo, é correto dizer: “Eu chego sempre pontualmente ao trabalho.” ou “Quando chego aqui, esqueço todos os meus problemas.”.
Bem, a língua portuguesa dispõe de uma infinidade de estruturas para oferecer ao falante. Há de se ressaltar, porém, que as escolhas não podem ser aleatórias. Existem construções ou criações linguísticas que, por estarem dentro dos padrões previstos, são aceitas imediatamente; outras, no entanto, são rejeitadas, e não há como o usuário empregá-las sem ter esse conhecimento.

Artigo publicado no Lagos Jornal em 10-10-2009.